top of page

Fauna e Flora

Na freguesia de Beringel, concelho de Beja, há uma micro-reserva biológica, apelidada de Colmeais. Foi a Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza, através do seu núcleo regional, que após uma pesquisa exaustiva na região, resultando na aquisição do terreno situado na freguesia de Beringel, que a integrou na sua rede.


Quatro hectares, constituídos por uma pequena área de azinhal, uma área maior de olival tradicional, com algumas árvores centenárias, e uma área de prados húmidos, que se situam na vizinhança de uma pequena linha de água. Uma diversidade de habitats, e aqui tão perto.
Uma área que se pintalga de diversas cores, consoante as estações do ano. Um verdadeiro espetáculo, oferecido pela natureza, em estado puro, e, felizmente, preservado.

Mas antes vamos aos fundamentos que levaram à constituição da Micro-Reserva Biológica dos Colmeais. “Anteriormente já diversos estudos tinham apontado para a importância botânica da região”, começa por explicar ao “Diário do Alentejo” José Martins, da Quercus. E acrescenta: “Já há algum tempo que era conhecida esta riqueza entre as localidades de Beringel, Mombeja e Peroguarda, nos limites entre os concelhos de Beja e Ferreira do Alentejo”. 

A explicação? “A diversidade de solos presentes, a transição climática e a distribuição de relevos”. Tudo isto, na verdade, traduz-se, segundo a Quercus, “numa diversidade botânica assinalável com a presença de algumas espécies raras, mas também ameaçadas”.
“Não podemos deixar de frisar que esta área esteve para ser integrada na Rede Natura 2000, acabando, porém, por não ser classificada”, lembra José Martins. Foi então necessário, no entender da Quercus, avançar para a preservação, até porque, de acordo com a Associação Nacional de Conservação da Natureza, é preciso não esquecer “a expansão de pedreiras que estão instaladas na vertente norte da serra do Mira, a intensificação agrícola que está a ter lugar, tendo em conta o desenvolvimento do projeto de regadio de Alqueva, bem como a expansão do olival intensivo, com grande recurso a herbicidas”. Fatores, estes, que segundo a Quercus, “estão a fazer desaparecer uma parte importante desta biodiversidade, pondo mesmo em risco algumas espécies raras”.

A juntar a tudo isto, segundo José Martins, “muitas vezes os proprietários não têm noção da riqueza que têm nos seus terrenos. Não sabem que existem, por exemplo, ali espécies raras. Quando o trator passa, tudo o que existe desaparece. Nestes locais, onde existe grande biodiversidade, é preciso que haja uma gestão ativa para a preservação dos valores naturais. Neste sentido, ou adquirimos o terreno, o que muitas vezes é complicado, ou temos de proceder a uma contratação para gerirmos esses espaços”.

Foi com o intuito de preservar esta riqueza que a Quercus criou a Micro-Reserva Biológica dos Colmeais, adquirindo o terreno, em Beringel, que passou a ser um espaço de conservação. “Ao adquirirmos o terreno garantimos uma gestão de longo prazo”, afirma José Martins.

Para a diversidade de habitats no local, contudo, contribuiu o facto de não haver mobilização de solos nem aplicação de herbicidas há vários anos, o que leva a que nele existiam várias das raridades assinaladas para a região e condições para que outras aqui possam ser estabelecidas no futuro.
Na Micro-Reserva Biológica dos Colmeais estão presentes, de acordo com José Martins, “mais de 150 espécies de flora”. E se há muitas a assinalar, uma delas, pela sua importância, é a Linaria Ricardoi, um endemismo da região de Beja. 


“É uma raridade. Havia um projeto de conservação desta espécie e começámos a verificar que se encontrava já em poucos sítios. Não poderíamos estar à espera que desaparecesse. Está aqui em grande força. Para dar uma ideia, neste momento, este sítio vale mais, como sítio de Rede Natura, que não é, do que o sítio de Rede Natura que foi criado no concelho de Cuba por causa da preservação da Linaria, que quase já lá não deve existir”, avança o representante da associação.
Para além da Linaria, porém, encontram-se outras raridades e motivos de orgulho em Beringel. Como é o caso da Cynara Tournefotii e a Echium Boissieri, cujos talos podem atingir quase três metros de altura. Sem esquecer, claro, a Adonnis Annua Sppp Annua e a Linaria Hirta.

“Há um dado muito curioso também a assinalar. No contexto regional este é o local onde detetámos o maior número de orquídeas”, afirma José Martins. Na verdade, até ao momento, estão assinaladas 11 espécies existentes.
“Estas micro-reservas são muito adequadas para flora, porque para proteger uma população de uma espécie, um, dois ou três hectares pode ser o suficiente para se terem milhares de pés e ter uma certa diversidade genética. Para animais, já depende muito. Um, dois ou três hectares podem não ser suficientes. Ao nível da fauna, porém, a área é rica em invertebrados. Avistamos, porém, também ali peneireiros cinzentos, mochos galegos, temos tocas de texugos, as raposas certamente que por ali passam, entre outros”.

O mais curioso, no entanto, é que, durante um estudo realizado pela Faculdade de Ciências, considerou-se que na micro-reserva está “registada a melhor população do cicadídeo Euryphara Contentei (Cigarra Verde) ”. “Outro grande valor a acrescentar a esta micro-reserva”, considera a Quercus. 
Agora a grande preocupação da Associação Nacional de Conservação da Natureza é a gestão e a manutenção do espaço e a Quercus começou por ter de vedar o espaço. “Não gostamos muito de vedações, mas teve mesmo de ser. Passavam pelo local motas todo-o-terreno e a própria população depositava ali animais mortos. Encontrámos muito lixo espalhado e não tivemos alternativa”, afirma o representante da associação no distrito. E acrescenta: “O local também se encontra apetrechado com várias aromáticas e as pessoas sempre se habituaram a ir lá colhê-las e, por vezes, acabavam por destruir outras espécies. Mas não só. Na altura da apanha dos cogumelos perdiam-se também, por exemplo, muitos bolbos de orquídeas. É complicado vedar o campo, porque as pessoas sempre se habituaram a passear nele, mas neste caso teve mesmo de ser, em nome da conservação e da preservação de um património natural de todos nós”.

As medidas de gestão passam também pela proteção das azinheiras, de modo a ampliar o bosquete aí existente, mas também pela revitalização das oliveiras, numa ótica de conservação e não de produção. A Quercus adianta ainda que se intervém no “controle de silvados junto à linha de água e no controle de erosão numa das vertentes a Oeste”.
 “Basicamente é isto que estamos a fazer. A limpar o olival e alguns caminhos. Estamos a fazer a gestão para manter as espécies e favorecer algumas, como é o caso da Linaria. Se há espécies que precisam de sol, não devemos deixar que outras, por exemplo, lhes façam sombra. Mas a micro--reserva está num certo equilíbrio. Há a dinâmica anual da tal sucessão das espécies”. Faz-se, assim, a gestão diferenciada de diversas parcelas, de modo a fomentar as populações das espécies alvo. 
Quanto a visitas à reserva, elas podem existir, contudo, segundo José Martins, “são muito controladas”. “Não estamos, digamos, de portas abertas. A área poderá ser visitada, mas está particularmente vocacionada para visitas de estudo, nomeadamente de especialistas, de estudantes da área. No entanto, têm de ser muito bem orientadas”, explica o representante da Quercus. Porquê? Para evitar que existam danos na flora a proteger.

Texto Bruna Soares Fotos José Ferrolho / in Diario do Alentejo

bottom of page